domingo, 21 de abril de 2019

Sermão: Ressurreição, dúvidas e fé

S. Mateus 28.1-17
National Presbyterian Church, Washington, DC, EUA
Rev. Dr. M. Craig Barnes
Domingo de Páscoa, 15 de abril de 2001.
Trad. Natan Cerqueira

Introdução

Tenho algo a dizer nesta manhã, particularmente àqueles de vocês que, hoje, aqui, se sentem à margem da fé. Isso inclui aqueles de vocês que vêm à igreja religiosamente, mas que ainda têm dúvidas, e inclui aqueles de vocês que não vêm à igreja com tanta frequência, mas que ainda têm fé. Eu acho que isso corresponde a todos aqui, pois há um crente e um descrente vivendo dentro de cada um de nós, especialmente na Páscoa.

Oremos.
Ó Deus, nós nos reunimos neste lugar para trazer nossas vidas diante das incríveis novas de que Jesus ressuscitou dos mortos. Nós pedimos para que uses esta proclamação não para nos tornar convictos, mas para nos transformar conforme a imagem desse Cristo ressurreto, para que possamos ser úteis à contínua missão dele neste mundo. Nós oramos em seu nome. Amém.
Proclamação

E se você tivesse visto a ressurreição de Jesus? E se você não precisasse depender da tradição da igreja ou de antigos documentos para afirmar a historicidade deste dia? E se você tivesse sido uma das testemunhas oculares da primeira Páscoa? Você conseguiria, então, crer, se tivesse visto acontecer? Bem, no evangelho segundo São Mateus, é-nos dito que os guardas no túmulo viram tudo.
De repente, “houve um grande terremoto; porque um anjo do Senhor desceu do céu, chegou-se, removeu a pedra e assentou-se sobre ela. O seu aspecto era como um relâmpago, e a sua veste, alva como a neve. E os guardas tremeram espavoridos e ficaram como se estivessem mortos”. Eles não apenas viram a ressurreição; ela os aterrorizou. Então, nós esperaríamos que, depois de ver algo tão avassalador, esses guardas se lançariam com rosto em terra e diriam: “Meu Deus! Estávamos errados! Nós acabamos de crucificar o Salvador, o Filho de Deus!” Isso é o que nós esperaríamos, mas não é o que aconteceu.

Mateus continua a nos contar a história dizendo que esses guardas foram imediatamente aos principais dos sacerdotes e “contaram tudo o que sucedera”. Daí, os principais dos sacerdotes lhes ofereceram “grande soma de dinheiro” para dizer às pessoas que os discípulos de Jesus haviam ido durante a noite e roubado o corpo morto. Então, os guardas pegaram o dinheiro e contaram a mentira.
Quê?! Quê?!?!?! Após ver a ressurreição de Jesus com seus próprios olhos, esses guardas ainda escolheram colocar sua fé no dinheiro?! Sim. Portanto, aparentemente, ver não é crer. Na verdade, nós não acreditamos no que vemos. Não. Nós vemos o que nós já escolhemos acreditar.

Cada um de nós é tentado a viver nossas vidas segundo alguma mitologia preferida, alguma narrativa do que poderia nos fazer verdadeiramente felizes. Talvez, para você, seja algo como a dos guardas: tudo vai dar certo se se obtiver uma grande soma de dinheiro. Ou talvez seu mito seja o de que você será feliz se conseguir se casar, ou se conseguir um emprego. Tudo estaria bem a partir daí. Sabem de uma coisa? Eu fico completamente espantado com a força dessas mitologias. Isso porque, apesar do fato de elas constantemente nos decepcionarem, nós continuamos a colocar nossa fé nelas. Nós fazemos isso ao mudar o mito só um pouquinho: se apenas eu tivesse um pouco mais de dinheiro, aí eu estaria bem. Ou se apenas eu tivesse um cônjuge diferente, ou um emprego diferente, então tudo estaria certo. Não importa que nós vemos pessoas que têm tudo isso que desejamos, mas que ainda continuam infelizes. Nós conseguimos ver isso, mas não conseguimos acreditar que nós continuaremos infelizes. Tampouco importa o que nós vemos sobre Jesus nas vidas daqueles que estão aprendendo a estar contentes em todas as circunstâncias. Não importa o que nós vemos e ponto final. Nós já escolhemos acreditar em nossos mitos. Tudo que nós realmente vemos é essa fantasia que, finalmente, nos fará felizes.

Eu vou lhe contar o motivo por que os guardas ficaram aterrorizados na Páscoa. Não foi apenas por causa do terremoto ou do relâmpago; foi porque a ressurreição estava desafiando as suas mitologias preferidas. Isso continua verdade até o dia de hoje. Apesar de todo o nosso compromisso científico com os fatos, ou de todas as nossas convicções de tomar decisões logicamente, quando se chega às coisas que realmente importam – coisas do coração e da alma – nós não nos importamos com as evidências; nós só veremos o que já escolhemos acreditar.

Mesmo que o próprio Jesus ressurreto houvesse lhe acordado hoje pela manhã com um terremoto e com muitos relâmpagos em seu quarto, eu lhe digo que isso o assustaria por um breve momento, mas amanhã você acordaria e iria atrás da mesma mitologia que você tem perseguido sua vida toda porque, no núcleo daquilo que definimos como vida, não está o que nós vemos, mas no que cremos.
Tudo bem, talvez a questão não seja poder ver. Mas e se você soubesse, contudo, que a ressurreição é verdadeira? E se você fizesse todo o trabalho duro teológico e escolhesse resistir às mitologias de nossa sociedade de que dinheiro ou trabalho lhe farão feliz? E se você pesquisasse todas as religiões e filosofias do mundo e fosse a um seminário, um mosteiro ou, pelo menos, a uma biblioteca [risos] e fizesse todo o trabalho duro teológico e, depois de tantos livros lidos e tanta investigação, você tivesse chegado ao conhecimento convicto de que o ensinamento da igreja acerca de Jesus e da ressurreição são verdadeiros? Você acreditaria, então? Você acreditaria se soubesse que é verdade? Não necessariamente.

Quando os guardas foram contar aos principais dos sacerdotes que Jesus havia ressuscitado dos mortos, não nos é dito que os sacerdotes duvidaram que era verdade. O que eles duvidaram é se deveria ser crido.  É por isso que os sacerdotes inventaram essa história sobre os discípulos terem ido e roubado o corpo. Eles sabiam a verdade! Eles sabiam que Jesus realmente era o Filho de Deus, que havia sido ressuscitado de dentre os mortos! Eles não estavam confusos acerca da verdade, mas eles duvidaram que se deveria acreditar.

Agora, nós estamos chegando mais perto das dúvidas daqueles de nós que andam perto das igrejas. Nós sabemos a verdade. Nós sabemos os hinos, sabemos os credos, sabemos quando levantar e quando sentar no culto, sabemos as histórias da Bíblia. Nós sabemos que foi o Filho de Deus que foi crucificado na última sexta-feira. Talvez você até saiba que ele ressuscitou dos mortos, mas ainda tem suas dúvidas. Alguns de nós duvidam que isso fará qualquer diferença em nossas vidas. Ah, sim, nós sabemos que Jesus é o Salvador, mas nós apenas duvidamos que ele possa nos salvar da bagunça que nós criamos. Outros de nós duvidam que sejamos dignos do tipo de amor que Jesus nos oferece. Nós conhecemos sobre a graça, ouvimos sobre ela, mas duvidamos que sejamos bons o suficiente para ela – como se isso tivesse alguma coisa a ver, pois nós recebemos graça justamente por não sermos bons o suficiente. Ainda assim, outros de nós têm dúvidas quanto a isso. Como os principais dos sacerdotes, nós conhecemos acerca desse Jesus ser o Salvador, nós apenas duvidamos que precisemos dele. Sabemos que algumas pessoas precisam dele, mas nós duvidamos que nós precisemos. Nós duvidamos que sejamos realmente tão maus assim. Nós só vamos continuar indo a igrejas, trabalhando duro, pois isso deverá funcionar para nós. Então, a despeito de tudo o que sabemos, toda pessoa que sabe sobre Jesus, ainda tem alguma dúvida, em algum lugar.

Portanto, assim como os guardas tiveram tanto medo que não puderam crer – medo tal que não pode ser vencido pelo que viram com seus próprios olhos – os principais dos sacerdotes tiveram tanta dúvida que não puderam crer; dúvida essa que não pôde ser dissipada pelo que eles sabiam ser verdade. Bem, se a fé não é encontrada por enxergar a evidência ou por saber a verdade, como a encontramos?

Felizmente, há outras personagens nessa história. Também nos é relatado sobre algumas mulheres que, como os guardas, também ficaram com medo ao ver o túmulo vazio. Também se é falado sobre os onze discípulos restantes, alguns dos quais, como os principais dos sacerdotes, tinham suas dúvidas sobre o que eles sabiam ser verdade. Mas a coisa que separa as mulheres e os discípulos dos guardas e dos principais dos sacerdotes é que as mulheres e os discípulos ainda assim escolheram adorar, apesar de seus medos e dúvidas. As mulheres, é-nos dito, lançaram-se aos pés de Jesus e adoraram. Quando os onze discípulos foram a Galileia, onde o Jesus ressurreto os encontrou, e estavam olhando diretamente para o Jesus ressurreto, é-nos dito que alguns deles ainda tinham suas dúvidas! Depois de tudo o que haviam visto, eles ainda tinham dúvidas. Isso é bastante notável, não é mesmo?

Mas o que é ainda mais notável é que, logo após relatar que alguns desses discípulos, que estavam olhando para Jesus, ainda tinham suas dúvidas, Mateus nos diz que Jesus deu a esses discípulos a Grande Comissão, pela qual ele mandou levar o Evangelho a todo canto do mundo e fazer discípulos de todas as nações. Logo, Jesus está confiando o futuro de sua Igreja a esses discípulos, que ainda têm medo e dúvidas. Por que ele faria isso? Porque Jesus sabe que os discípulos ficarão bem se eles simplesmente continuarem a adorar. E é assim que a fé é nutrida na sua vida e também na minha.
Aparentemente, Jesus não se importa muito com nossos medos e nossas dúvidas, contanto que continuemos a adorar, pois é na adoração que nós perdemos a nós mesmos aos pés de Jesus. Perdemos nossas certezas e nossas dúvidas, perdemos nossa ousadia e nosso medo. Jesus nem se impressiona muito com nossas certezas e nossa ousadia, nem se desanima com nossa dúvida e nosso medo. O que importa para Jesus são nossas escolhas. A decisão de crer, decisão de confiar, decisão de amar o Salvador apesar de nossas dúvidas, de nossos medos e de não o entender metade do tempo, de que nós escolheremos ter fé. É por isso que nós adoramos. É na adoração que nós fazemos essa escolha, é nela que nós nos lembramos de quem somos como povo, que escolheu render a vida ao Salvador que, nesta última sexta-feira, estava morrendo para lhe amar. Enquanto você faz isso, você percebe que também fez uma escolha a respeito de como você vai cumprir a Grande Comissão de Cristo para sua vida.

Vocês entendem o que quero dizer? Vocês veem que toda a missão e propósito de sua vida é completamente dependente do que você escolhe fazer com a Páscoa? É dramático mesmo. Eu não estou lhe dizendo para não ter medo porque Jesus vai ajuda-lo a realizar seus sonhos mitológicos. Eu não estou dizendo isso. Tampouco estou dizendo que você não precisa ter dúvida nenhuma, pois nós temos muitas evidências para comprovar essa questão da ressurreição. Não, eu tampouco estou dizendo isso. O que eu estou dizendo é que Jesus Cristo ressuscitou dos mortos! Isso é notícia digna de um pouco de medo e dúvida porque, se você escolher acreditar nela, ela mudará tudo o mais em que você crê e vai chacoalhar e moldar sua missão de vida.

A Páscoa não é sobre primavera, seiva nas árvores, renovo e o amor ser mais forte que a morte. Sério mesmo: isso lhes empolga? Isso muda a vida de alguém aqui? Eu acho que não! Será que foi por essas coisas que esses discípulos assustados e cheios de dúvidas foram capazes de cumprir a missão de suas vidas e sacudir os alicerces de Roma? Foi por causa de alguma noção sentimental do amor ser mais forte que a morte? Não! Eles estavam indo por todo mundo proclamando que Jesus Cristo havia fisicamente ressuscitado dos mortos e que nele você também pode ter nova vida! Essa é a mensagem que muda o mundo. Ela também pode mudar sua vida, se você escolher acreditar. Como você fará isso? Como fará essa impressionante escolha de crer na possibilidade de uma nova vida em Cristo, apesar de todos os seus medos e dúvidas? Como fazer essa escolha? Apenas se lançando aos pés de Jesus. Apenas em adoração.

Então, para que fique claro, adorar não é algo seguro. Não, a adoração abalará as próprias estruturas das mitologias que você tem perseguido sua vida inteira e ela lhe forçará, daqui por diante, a buscar a verdade honestamente até que, eventualmente, você comece a duvidar de suas dúvidas. Ao longo do caminho, enquanto você continua a adorar, enquanto você continua a se encontrar aos pés de Jesus, você descobrirá, eventualmente, que não se importa muito com seus medos e dúvidas, pois, então, sua vida terá sido entregue ao amor, ao amor do Salvador que lhe amou. Esse amor que lhe muda. Esse amor que lhe permite usar sua vida para fazer uma grande diferença. Oremos.

Ó Deus, nós só temos esta única vida e gostaríamos que ela fosse bem vivida, e que  fizesse alguma diferença em teu mundo. Então, a despeito de nossos medos e dúvidas, nós escolhemos adorar e pedimos que, aos pés de Jesus, tu nos transformes nas pessoas que tu nos criaste para sermos desde o princípio. Amém.



2 comentários:

Unknown disse...

Ola a paz gostaria de saber se possui em pdf todos aqueles livros de liturgia reformada? Obrigado e fique na paz

Unknown disse...

Abençoadora mensagem.