Em um tópico da comunidade da Igreja Presbiteriana do Brasil no Orkut, alguém propôs que descrevêssemos as igrejas dos nossos sonhos. Tanto quanto à teologia, práticas litúrgicas e pastorais e até mesmo o tipo e número de pessoas que a freqüentariam.
Eis com o que me saí:
Denominação: Igreja Protestante Reformada do Brasil/Igreja Presbiteriana do Brasil
Confissão: Belga/Helvetica Posterior
Orientação teológica: Neo-ortodoxia barthiana
Arquitetura: Gótica, românica ou neoclássica; templo em forma de cruz; o coro fica em um dos transeptos (os "braços"), o conjunto, no outro. No presbitério, apenas o púlpito, a Mesa, a Pia Batismal e a estante de leituras. Vitrais retratando passagens bíblicas. Uma cruz céltica prateada, com disco dourado, na parede. Acústica que dispensa microfonação. Anexo Administrativo, Edifício de Educação Religiosa e Casa Pastoral seguindo a mesma linha arquitetônica do templo.
Pastores: Um só ministro, graduado em curso reconhecido pelo MEC e pós-graduado em curso reconhecido pela CAPES.
Membresia: 200 a 300 membros, de variadas faixas etárias e níveis sociais.
Liturgia: Cristã histórica, com rito de entrada, penitência, liturgia da Palavra (todas as leituras do Lecionário, sermão preferencialmente baseado no Evangelho), liturgia eucarística (completa, com Grande Ação de Graças, toda semana) e ritos de intercessão e de envio.
Todo o serviço é dirigido de trás da Mesa, exceto pelas leituras, o sermão e a ministração do Sagrado Batismo.
Paramentação: para o ministro, toga genebrina preta, camisa clerical, peitilho (barrister tabs) e estola. Para presbíteros e diáconos (quando desempenharem função litúrgica), alba e estola do respectivo ofício. Mesa, púlpito e estante de leituras decorados na cor da respectiva estação (assim como as estolas). Sobre a Mesa, duas velas e uma estante para a Bíblia/ordem litúrgica.
Coro trajando sempre becas com acessórios nas cores litúrgicas apropriadas.
Costumes: Dentro do templo, reverência absoluta. Templo ou capela anexa sempre abertos para visitação e oração durante a semana. Fora do templo, especialmente no salão social, descontração também absoluta.
Música: No culto, estilos variados, desde o canto gregoriano até o pop-rock. As letras não podem jamais ser mantras repetitivos sem conteúdo; cada letra deve ser uma verdadeira aula de teologia em verso.
A igreja teria um Mestre-de-Capela, músico contratado, de formação superior, encarregado de todo o programa musical, acumulando as funções de Organista Titular, Regente Titular do Coro e Chefe de Departamento do Conjunto. Também seria de sua responsabilidade ministrar aulas de música aos interessados (subsidiadas em parte pela igreja, em parte pelos mesmos), mantendo sempre um bom número de músicos bem treinados entre os membros.
Fora dos horários de culto, uso do órgão e do templo para concertos. Uso do Auditório/Salão Social para outros eventos culturais, como cursos e espetáculos de dança, teatro e música contemporânea.
Instrumentos: Órgão de tubos (pequeno, 1500 a 2000 tubos no máximo, com dois manuais e pedaleira), piano, guitarra, baixo e bateria (estes últimos, com seus vocalistas, presos num aquário de acrílico isolado com captação, e o volume sempre no mínimo necessário para ouvir direito).
Escola Dominical: Com divisão etária até os adolescentes. Jovens e adultos em classes conjuntas, com opções de temas básicos, intermediários e avançados. Aulas sólidas, baseadas em pesquisa bibliográfica, nada de leitura de revista.
Perfil missionário: Ênfase em serviço social, educação e plantação sistemática de congregações. Rejeição ao modelo das megaigrejas.
Qual o sonho de vocês?
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
sexta-feira, 10 de outubro de 2008
Catedral Evangélica de São Paulo

Antes de falar sobre o culto que eu assisti por lá, alguns comentários sobre minha experiência com essa igreja, em geral. Fui pra lá participar do XX Seminário de Música Sacra da SOEMUS (no meu entendimento, a maior publicadora de música sacra do Brasil, não apenas entre os protestantes).
O Seminário, coordenado pela lenda viva, Rev. Mst.º João Wilson Faustini, divide-se em aulas, com variados módulos (regência coral básica e avançada, acompanhamento de coro e congregação para músicos, técnica vocal etc.), e também em prática coral. As aulas foram ministradas no monumental (senão pela arquitetura, que é bem International Style, ao menos pelo tamanho) Edifício Eduardo Carlos Pereira. À primeira vista, eu acreditava que, como ocorre na minha igreja, em Franca, o imóvel fosse um prédio comercial de propriedade da igreja e alugado a diversos escritórios, servindo como fonte de renda. Qual não foi minha surpresa ao saber que não, que todos os trabalhos desenvolvidos no ECP são da própria igreja, incluindo uma escola de música com uma impressionante orquestra. E isso reflete diretamente na qualidade da música litúrgica da Catedral. Mais sobre isso adiante.
Eu disse que a Catedral ainda não é a sede administrativa da IPI em São Paulo; existem planos (não sei se já implementados) para se centralizar a administração do Presbitério de São Paulo no alto do ECP. Se isso não tornar a Primeira IPI em uma Catedral de pleno direito, não sei o que mais tornaria!
O ECP ainda abriga a Capela da Catedral, um pequeno e simpático (embora exageradamente zwingliano) santuário. Mesa central, púlpito lateral, um órgão eletrônico (litúrgico, com pedaleiras e manuais completos, nada dessas coisinhas que a gente é obrigado a tocar no interior) e um piano. Queria ter tirado uma foto da capela, mas não pude por falta de tempo.
Também de interesse para mim foi o salão social da Catedral. Não sei se é o caso, mas ele tem exatamente a cara de (conforme o costume presbiteriano) ter servido como templo antes da construção do próprio. Portas e janelas em arco ogival, motivos decorativos em gesso e cimento, janelas em vidro colorido. Por dentro, uma galeria atrás e uma plataforma elevada na frente, que certamente se presta como coro/presbitério. Logo abaixo dele, um piano meia-cauda, que acusa sua idade com orgulho. O salão me pareceu pequeno para o tamanho da congregação da Catedral, mas aparentemente, não é mesmo costume dos nativos ficar de papo e cafezinho depois do culto. Por motivos óbvios que eu vou narrar adiante.
Entre o ECP e o salão, uma quadra poliesportiva relativamente bem conservada, embora carente de uma arquibancada. Não me parece ser usada com freqüência, também.
O templo em si é impressionante, a começar pelo tamanho. É o maior templo protestante que eu conheço (megaigrejas pentecostais não contam, primeiro porque não são protestantes, e segundo, porque não são construídas como templos, e sim como auditórios).
Estilisticamente, o prédio imita o estilo gótico francês por fora. Imita, porque, afinal, ele é construído em tijolo, cimento, ferro e concreto; os elementos decorativos são enchimento de gesso e cimento. Não que isso seja um demérito, ao contrário, no Brasil, qualquer inclinação arquitetônica de uma igreja protestante a um estilo apropriadamente religioso só pode ser louvada! E tudo pintado de um branco impecável (a foto acima é antiga; eu fui logo depois da conclusão de uma reforma geral).
Internamente, o nártex (hall de entrada) é impecavelmente gótico, com o teto em abóbadas ogivais. Na nave, encontramos uma marca que é muito mais patente no gótico inglês: um teto reto de madeira trabalhada, envernizada (laqueada, talvez) e bem polida.
O prédio segue o esquema geral de construção em cruz, em três camadas verticais; nível do chão, trifório e clerestório. No nível do chão, encontramos janelas altas. No trifório, uma galeria que começa na área sobre o hall de entrada e estende-se sobre as laterais da nave, tomando também os transeptos. E janelas no clerestório.
Exceto por algumas janelas de vidro transparente na galeria, todas as demais são belos vitrais com motivos florais (certamente uma concessão da época aos pendores puritânicos comuns em São Paulo -- e todos sabemos como os puritanos abominam arte figurativa, mesmo que seja de passagens e personagens bíblicos...).
Curiosamente, os vitrais podem ser abertos, ajudando na ventilação do lugar. Não que costumem ser necessários; a combinação de pé-direito alto e revestimentos de pedra lisa ajuda a manter uma temperatura constante e agradavelmente fria.
O Presbitério é elevado em quatro degraus (será que é pra evitar o três, comum nas igrejas romanas, ou é pra facilitar a vista do povo?). Nele, temos o púlpito do lado esquerdo (tenho fotos antigas da Catedral em que ele ficava na posição central comum às igrejas puritanas). No centro, a Mesa do Senhor com um número absurdamente grande de cadeiras. Ao fundo, na ábside, a jóia da Catedral: um órgão Austin (Opus 353) de ação eletropneumática, de 1911. Dois manuais de cinco oitavas e uma pedaleira completa. Não anotei as especificações de registração, mas a organista me fez notar que não há registros de 32 pés, apenas alguns de 16 no Grande e na pedaleira (e mesmo esses, para caber, são curvos). Mais detalhes podem ser vistos no site da Catedral.
Bom, sobre o culto da Catedral. Vou seguir o esquema dos relatórios do Mystery Worshipper, do site Ship of Fools, embora eu fosse tudo menos anônimo nesse culto.
O boletim desse domingo, com a liturgia, pode ser encontrado aqui.
A Igreja: Catedral Evangélica de São Paulo (Primeira Igreja Presbiteriana Independente)
Denominação: Igreja Presbiteriana Independente do Brasil
A vizinhança: A Catedral fica no "canto leste" da Consolação, em São Paulo, perto da Praça da República (e respectiva estação do Metrô).
Elenco: Revs. Abival Pires da Silveira, Elizeu Rodrigues Cremm e Valdinei Aparecido Ferreira, além de duas simpáticas diaconisas e alguns presbíteros.
Dia e hora: Domingo, 31 de agosto de 2008, 10h45.
Qual foi o nome do culto?
Culto das 10h45, 22.º Domingo do Tempo Comum. Era, também, pelo calendário presbiteriano, o Dia do Pastor, o que causou uma confusão engraçada: os paramentos do templo eram verdes, mas os ministros estavam de estolas brancas!
Quão cheio estava o prédio?
A nave estava cerca de 70% ocupada. A galeria geralmente só é aberta para cultos especiais.
Alguém lhe cumprimentou pessoalmente?
Eu estava acompanhado de um dos presbíteros da igreja, que me apresentou a um monte de gente e aproveitou para fazer propaganda deste blog...
Seu banco estava confortável?
Tanto quanto se espera de um banco de igreja com assento em madeira, sim.
Como você descreveria o ambiente antes do culto?
Nós chegamos em cima da hora, mas as pessoas pareciam chegar aos seus lugares, cumprimentando e conversando pouco e baixo com quem encontravam.
Quais foram, exatamente, as palavras iniciais do culto?
Conforme o boletim, foi o intróito Povo Santo, de M. A. Campra, arranjo e versão brasileira de J. W. Faustini. Seguiu-se uma oração doxológica extemporânea pelo Rev. Abival.
Quais livros foram usados pela congregação?
A Bíblia mais comumente usada no presbiterianismo brasileiro é a Almeida, Revista e Atualizada, da qual havia vários exemplares nos bancos. A IPIB usa seu hinário oficial, Cantai todos os povos, mas as letras de todos os hinos estavam no boletim.
Que instrumentos musicais foram utilizados?
Órgão de tubos e orquestra (formação sinfônica tradicional).
Alguma coisa o distraiu durante o culto?
Meu hiperativo anfitrião fazia comentários constantes sobre a qualidade da liturgia e o andamento do culto. Em geral, bastante engraçados.
O culto foi engessado, saltitante, ou o quê?
Seminaristas e detratores em geral chamam o culto da Catedral de "missa". Certamente é a liturgia presbiteriana mais elaborada da cidade de São Paulo, bastante formal. Mas fluiu naturalmente, sem a teatralidade que trai quem "não é, mas tenta ser" litúrgico.
Qual foi a duração do sermão?
Coisa de uma meia hora.
Em uma escala de 1 a 10, qual a nota do pregador?
7; A mensagem foi teologicamente sólida, mas eu não sou exatamente um fã de alegorias na pregação.
Em suma, sobre o quê foi o sermão?
Nós devemos ter na Palavra de Deus a nossa segurança, assim como o alpinista põe a sua nos grampos cravados na rocha.
Que parte do culto foi como estar no céu?
O simples fato de poder participar de um verdadeiro culto high church foi o ponto alto do meu mês, quiçá do meu ano. A organista manda muitíssimo bem, e a seleção musical do dia foi excelente. Poder cantar um dos antemas com o coro foi muito legal, também.
E qual parte foi como estar... tipo... no outro lugar?
Eu realmente não gosto de sermões alegóricos. Foi o único ponto negativo.
O que aconteceu quando você ficou lá com cara de perdido?
Meu anfitrião não deixou isso acontecer... Ainda me conseguiu dois números da revista oficial da Catedral, com bons artigos sobre história e teologia. Minha viagem de volta para Franca foi bastante instrutiva!
Como você descreveria o café depois do culto?
A Catedral parece não ter esse costume, visto que o culto das 10h45 acaba por volta da 1 da tarde... Todo mundo volta correndo pra casa ou pro restaurante mais próximo. Eu corri pra filial mais próxima da tradicional Padaria Sta. Efigênia, já que tinha um ônibus pra pegar mais tarde.
Como você se sentiria em fazer dela a sua igreja, de 0 a 10?
10! Se eu morasse em São Paulo, talvez apenas a Igreja Luterana fosse um páreo duro para a Catedral.
O culto lhe fez sentir-se feliz em ser cristão?
Com certeza!
Diga uma coisa da qual você certamente vai se lembrar ao longo da semana.
O som do órgão de tubos. Aquele final de semana foi, afinal, minha primeira vez ouvindo um!
sexta-feira, 26 de setembro de 2008
Manual de Culto da SLR
Adaptado (pra variar) de uma discussão na comunidade da Igreja Presbiteriana do Brasil, no Orkut:
Já se suscitou com veemência a necessidade da elaboração de um Manual do Culto de uso oficial para a IPB, que aborde as necessidades e tendências contemporâneas de todos os segmentos, de todo o espectro litúrgico-ideológico da nossa Igreja.
(N. do E.: o Manual da IPI é excelente, mas vá sugerir sua adoção na IPB...)
O manual atual não é nem oficial, como bem notou o Rev. Carlos Alberto Chaves Fernandes. Foi um guia para o uso dos líderes leigos, formulado pelo Rev. Modesto Carvalhosa, que recebeu uns extras e acabou sendo publicado pela CEP na falta de outro melhor no Brasil. Vale lembrar o que o Dr. José Ávila também já lembrou: os ministros que vinham dos EUA, sobretudo os da Igreja do Norte, usavam o Livro de Oração Comum (anglicano) como manual, de modo que eles já tinham uma formação litúrgica apropriada.
Mas como a ligação da IPB acabou sendo (como ainda é) mais forte com a Igreja do Sul, esta bem mais puritana e menos afeita a rituais elaborados, acabamos herdando o culto avivalista de fronteira destes últimos.
Interessante lembrar que o movimento de resgate litúrgico da Igreja do Norte (atual PCUSA) começou no fim do século XIX com o interesse e a dedicação de um único homem, o presbítero Benjamin Comegys.
Ele foi um pesquisador dedicado, tanto que um presbiteriano da old school (essencialmente, neo-puritanos) disse da biblioteca dele: "Um estranho que visitasse a sua biblioteca provavelmente concluiria que seu proprietário era um ministro da Igreja da Inglaterra, visto que poucos clérigos deste país, mesmo os da Igreja Episcopal, possuem uma biblioteca de liturgia tão completa.".
Esse presbítero, inspirado pela leitura do livro Eutaxia, or the Presbyterian Liturgies: Historical Sketches ("Eutaxia, ou As liturgias presbiterianas: esboços históricos"), de Charles Baird, (em que discretamente tentava introduzir suas idéias litúrgicas, tentando não se encrencar com os puritanos da Casa Editora da denominação -- coincidência?) começou a rascunhar um guia litúrgico para a igreja.
O livro de Comegys conseguiu despertar a simpatia de muitos ministros e igrejas, mesmo não tendo a chancela da obrigatoriedade.
O calendário cristão, a maior ênfase no culto como ato global (em detrimento da centralidade da pregação) e o resgate da importância dos sacramentos passaram a fazer parte da ordem do dia da PCUSA.
Logo, a igreja revisou seu Diretório de Culto e, posteriormente, editou um novo Book of Common Order, permitindo o uso de liturgias mais elaboradas, com numerosas sugestões de ordens de culto e orações comuns (em detrimento das orações extemporâneas que eram a "jóia da coroa" do culto puritano).
Nada foi imposto, o movimento ganhou impulso por si só!
E inspirado na saga (narrada com mais detalhes aqui, por um presbiteriano da Old School) desse heróico presbítero, eu queria lançar um esforço comunitário para editarmos um manual próprio nosso, que atendesse às necessidades do nosso tempo e a todas as linhas presentes na IPB (e nos demais ramos conservadores do cristianismo reformado brasileiro)!
Penso em algo nos moldes do LOC da IEAB: vários capítulos, com ordens de culto que atendam às diferentes linhas litúrgicas presentes na IPB. Lá, geralmente o Rito 1 é anglo-reformado e o Rito 2 é anglo-católico. O nosso poderia ser nessas linhas:
Vamos discutir?
ATUALIZAÇÃO (12/01/2009):
Os materiais já publicados do Manual podem ser encontrados para download aqui!
Já se suscitou com veemência a necessidade da elaboração de um Manual do Culto de uso oficial para a IPB, que aborde as necessidades e tendências contemporâneas de todos os segmentos, de todo o espectro litúrgico-ideológico da nossa Igreja.
(N. do E.: o Manual da IPI é excelente, mas vá sugerir sua adoção na IPB...)
O manual atual não é nem oficial, como bem notou o Rev. Carlos Alberto Chaves Fernandes. Foi um guia para o uso dos líderes leigos, formulado pelo Rev. Modesto Carvalhosa, que recebeu uns extras e acabou sendo publicado pela CEP na falta de outro melhor no Brasil. Vale lembrar o que o Dr. José Ávila também já lembrou: os ministros que vinham dos EUA, sobretudo os da Igreja do Norte, usavam o Livro de Oração Comum (anglicano) como manual, de modo que eles já tinham uma formação litúrgica apropriada.
Mas como a ligação da IPB acabou sendo (como ainda é) mais forte com a Igreja do Sul, esta bem mais puritana e menos afeita a rituais elaborados, acabamos herdando o culto avivalista de fronteira destes últimos.
Interessante lembrar que o movimento de resgate litúrgico da Igreja do Norte (atual PCUSA) começou no fim do século XIX com o interesse e a dedicação de um único homem, o presbítero Benjamin Comegys.
Ele foi um pesquisador dedicado, tanto que um presbiteriano da old school (essencialmente, neo-puritanos) disse da biblioteca dele: "Um estranho que visitasse a sua biblioteca provavelmente concluiria que seu proprietário era um ministro da Igreja da Inglaterra, visto que poucos clérigos deste país, mesmo os da Igreja Episcopal, possuem uma biblioteca de liturgia tão completa.".
Esse presbítero, inspirado pela leitura do livro Eutaxia, or the Presbyterian Liturgies: Historical Sketches ("Eutaxia, ou As liturgias presbiterianas: esboços históricos"), de Charles Baird, (em que discretamente tentava introduzir suas idéias litúrgicas, tentando não se encrencar com os puritanos da Casa Editora da denominação -- coincidência?) começou a rascunhar um guia litúrgico para a igreja.
O livro de Comegys conseguiu despertar a simpatia de muitos ministros e igrejas, mesmo não tendo a chancela da obrigatoriedade.
O calendário cristão, a maior ênfase no culto como ato global (em detrimento da centralidade da pregação) e o resgate da importância dos sacramentos passaram a fazer parte da ordem do dia da PCUSA.
Logo, a igreja revisou seu Diretório de Culto e, posteriormente, editou um novo Book of Common Order, permitindo o uso de liturgias mais elaboradas, com numerosas sugestões de ordens de culto e orações comuns (em detrimento das orações extemporâneas que eram a "jóia da coroa" do culto puritano).
Nada foi imposto, o movimento ganhou impulso por si só!
E inspirado na saga (narrada com mais detalhes aqui, por um presbiteriano da Old School) desse heróico presbítero, eu queria lançar um esforço comunitário para editarmos um manual próprio nosso, que atendesse às necessidades do nosso tempo e a todas as linhas presentes na IPB (e nos demais ramos conservadores do cristianismo reformado brasileiro)!
Penso em algo nos moldes do LOC da IEAB: vários capítulos, com ordens de culto que atendam às diferentes linhas litúrgicas presentes na IPB. Lá, geralmente o Rito 1 é anglo-reformado e o Rito 2 é anglo-católico. O nosso poderia ser nessas linhas:
Rito 1: Culto Cristão na tradição bimilenar, com as formas clássicas ocidentais da Liturgia da Palavra e Liturgia da Eucaristia;E a mesma coisa para os sacramentos e atos sacramentais:
Rito 2: Culto no modelo Reformado europeu, baseado nos modelos genebrino, huguenote e no da Igreja Reformada americana (de herança húngara);
Rito 3: Culto no modelo do Diretório de Westminster;
Rito 4: Culto no modelo puritano/avivalista;
Rito 5: Adaptação do modelo contemporâneo, com linhas e instruções gerais para não se perder a identidade reformada.
Eucaristia 1: Liturgia completa com Grande Ação de Graças;E capítulos extras com instruções sobre arquitetura (externa e interna), formas de organizar e executar o cerimonial equilibrando a formalidade com a linguagem contemporânea, além de sugestões diversas de coletas, orações, formas de intercessão, um lecionário...
Eucaristia 2: Rito simplificado, com Oração Eucarística, Pai Nosso e fração na Instituição;
Eucaristia 3: Ordem para a comunhão dos enfermos e outras situações extraordinárias.
Batismo 1: Liturgia completa com Ação de Graças;
Batismo 2: Rito simplificado;
Batismo 3: Rito de batismo de emergência.
Confirmação 1: Liturgia completa para a Profissão de Fé;
Confirmação 2: Rito simplificado.
Ordenação 1: Liturgia com cerimonial completo para a ordenação de ministros e oficiais da Igreja;
Ordenação 2: Rito simplificado;
Imposição de mãos: Rito para a posse e instalação, com imposição de mãos, de diretorias de sociedades internas e outras lideranças não-ordenadas da Igreja.
Matrimônio 1: Rito completo para a realização da cerimônia religiosa com efeitos civis;
Matrimônio 2: Cerimônia religiosa sem efeitos civis (casal que já casou ou está para casar em cartório, em ato separado);
Matrimônio 3: Rito simplificado para situações extraordinárias (casamentos campais etc.).
Unção dos enfermos: Rito reformado de intercessão com unção dos enfermos.
Ofício Fúnebre
Vamos discutir?
ATUALIZAÇÃO (12/01/2009):
Os materiais já publicados do Manual podem ser encontrados para download aqui!
domingo, 17 de agosto de 2008
Anunciar a morte do Senhor
Por Jeffrey Meyers
(leia o original aqui)
Na minha apresentação no Colóquio da Assembléia Geral [da Presbyterian Church of America, N. do T.] sobre os sacramentos, eu argumentei a favor de uma experiência mais alegre e comunitária na Mesa do Senhor. Will Barker deu uma breve e generosa resposta ao meu artigo, sugerindo que há lugar para uma experiência mais solene à Mesa. Ele se baseou na afirmação de Paulo em I Coríntios 11.26, "Pois toda vez que comerdes do pão e beberdes do cálice, anunciais a morte do Senhor até que ele venha." Eu creio que a réplica de 10 minutos do Dr. Barker será postada em breve.
Há, aqui, algumas coisas a serem pensadas. Primeiro, eu admito que pode haver ocasião e lugar para uma celebração mais solene e sóbria da Ceia. Dependendo do que tiver acontecido ou estiver acontecendo com a congregação, pode ser apropriado. A igreja pode ter uma celebração mais moderada da Ceia imediatamente após a morte de um membro querido, ou da excomunhão de um irmão ou irmã, ou talvez em qualquer época em que a congregação como um todo precise velar ou arrepender-se de algo. A primeira vez que a igreja de Corinto se reuniu para a Mesa do Senhor depois que a carta de Paulo foi lida para a congregação provavelmente não foi uma experiência muito alegre. Eu não tenho problemas com cultos eucarísticos solenes, celebrados ocasionalmente. Pelo menos uma vez no ano, na quinta-feira da Paixão, a ceia provavelmente deveria ser celebrada assim.
Em segundo lugar, "anunciar a morte do Senhor" não é a mesma coisa que velar a sua morte, ou pior, tentar reviver as circunstâncias da sua morte. "Anunciar a morte do Senhor" pode significar, de duas, uma: Por um lado, pode ser uma referência ao fato de que as Boas Novas da morte de Jesus sejam proclamadas toda vez que comemos do pão e bebemos do cálice. A Santa Ceia é uma atuação pública da aplicação da morte de Jesus ao povo de Deus. O fato de que esta "proclamação" acontece quando comemos do pão e bebemos do cálice significa que não é apenas uma representação ou dramatização da morte de Jesus. Comer e beber não têm como ser consideradas representações simbólicas da morte. Comer e beber estão ligados à vida e ao viver!
A morte de Jesus aconteceu. Está no passado. Nós viemos à Mesa, onde já estão o pão e o vinho. O corpo e o sangue estão separados, o que significa que a morte aconteceu. No sistema sacrificial do Antigo Testamento, o sangue sempre deveria ser separado do corpo da vítima. Nós vimos à Mesa que foi aspergida para nós, porque Jesus já morreu. Nós, agora, colhemos os benefícios da sua morte. A morte de Jesus não pode ser re-dramatizada à Mesa. Nós podemos apenas desfrutar dos resultados da morte de Jesus - seu corpo e sangue dados a nós como alimento. Novamente, é uma mesa, e não um túmulo.
Em terceiro lugar, a outra interpretação de I Coríntios 11.26 é a que eu prefiro. A Ceia do Senhor é uma refeição memorial da aliança. Por meio da Ceia a igreja rememora a morte de Jesus, para o Pai. Compreendida no contexto dos "memoriais" do Antigo Testamento, esta refeição memorial da Nova Aliança é uma oração ritual dramatizada, relembrando a Deus de sua aliança. A Santa Ceia é o rito memorial da Nova Aliança. É o cumprimento de todos os antigos meios que o Senhor instituiu, pelos quais seu povo invocava o seu Nome e dramaticamente o pedia para que se lembrasse de sua aliança. Todos os memoriais da velha ordem estão agora cumpridos e completos (consolidados) em uma única e simples refeição memorial da aliança. Jesus diz: "Fazei isto em memória de mim".
À mesa, nós rememoramos a morte de Jesus. O sentido não é o de nós simplesmente a recordarmos, mas sim de nós relembrarmos a Deus das promessas de sua aliança para conosco. É da nossa ação com relação a Deus. É a nossa prece a Deus, o lembrar-se de Jesus e de manter sua aliança. Nós anunciamos ao Pai a morte do Senhor, pedindo-lhe para que mantenha as suas generosas promessas em Cristo. No caso da Santa Ceia, essa rememoração é um ato da congregação, uma declaração das promessas de Deus. Isso vem à tona nas orações de ação de graças (no grego: eucaristia) e de memorial antes da distribuição e comunhão do pão e do vinho, mas não se limita a elas. De fato, a refeição memorial inteira anuncia a morte de Cristo, como Paulo afirma em I Coríntios 11.26: todas as vezes que comemos do pão e bebemos do cálice, anunciamos a morte de Cristo.
Essa "proclamação" não se limita à oração ou ao partir do pão, mas ainda rememoramos Cristo ao Pai por meio da refeição comunitária. Eis o memorial do sacrifício redentivo de teu Filho, ó Senhor; lembra-te dele e sê generoso para conosco. Tradicionalmente, essas orações sempre incluíram um resumo da vida e da obra de Jesus Cristo. Uma oração eucarística deveria soar algo assim:
Uma oração eucarística assim, unida à realização da Santa Ceia, anunciam a morte do Senhor (I Coríntios 11.26) para o Pai. A refeição toda é uma oração dramática, uma afirmação das promessas do Pai pela memória do nascimento, vida, paixão, morte e ressureição de seu Filho por nós.
Tudo isto para dizer que a nossa proclamação da morte do Senhor à Mesa não exige nem implica em uma atmosfera solene, funérea, da Santa Ceia. A morte de Jesus deve ser proclamada com alegria, seja para os outros (como anúncio do Evangelho), seja para o Pai (como memorial da obra de Jesus por nós).
(leia o original aqui)
Na minha apresentação no Colóquio da Assembléia Geral [da Presbyterian Church of America, N. do T.] sobre os sacramentos, eu argumentei a favor de uma experiência mais alegre e comunitária na Mesa do Senhor. Will Barker deu uma breve e generosa resposta ao meu artigo, sugerindo que há lugar para uma experiência mais solene à Mesa. Ele se baseou na afirmação de Paulo em I Coríntios 11.26, "Pois toda vez que comerdes do pão e beberdes do cálice, anunciais a morte do Senhor até que ele venha." Eu creio que a réplica de 10 minutos do Dr. Barker será postada em breve.
Há, aqui, algumas coisas a serem pensadas. Primeiro, eu admito que pode haver ocasião e lugar para uma celebração mais solene e sóbria da Ceia. Dependendo do que tiver acontecido ou estiver acontecendo com a congregação, pode ser apropriado. A igreja pode ter uma celebração mais moderada da Ceia imediatamente após a morte de um membro querido, ou da excomunhão de um irmão ou irmã, ou talvez em qualquer época em que a congregação como um todo precise velar ou arrepender-se de algo. A primeira vez que a igreja de Corinto se reuniu para a Mesa do Senhor depois que a carta de Paulo foi lida para a congregação provavelmente não foi uma experiência muito alegre. Eu não tenho problemas com cultos eucarísticos solenes, celebrados ocasionalmente. Pelo menos uma vez no ano, na quinta-feira da Paixão, a ceia provavelmente deveria ser celebrada assim.
Em segundo lugar, "anunciar a morte do Senhor" não é a mesma coisa que velar a sua morte, ou pior, tentar reviver as circunstâncias da sua morte. "Anunciar a morte do Senhor" pode significar, de duas, uma: Por um lado, pode ser uma referência ao fato de que as Boas Novas da morte de Jesus sejam proclamadas toda vez que comemos do pão e bebemos do cálice. A Santa Ceia é uma atuação pública da aplicação da morte de Jesus ao povo de Deus. O fato de que esta "proclamação" acontece quando comemos do pão e bebemos do cálice significa que não é apenas uma representação ou dramatização da morte de Jesus. Comer e beber não têm como ser consideradas representações simbólicas da morte. Comer e beber estão ligados à vida e ao viver!
A morte de Jesus aconteceu. Está no passado. Nós viemos à Mesa, onde já estão o pão e o vinho. O corpo e o sangue estão separados, o que significa que a morte aconteceu. No sistema sacrificial do Antigo Testamento, o sangue sempre deveria ser separado do corpo da vítima. Nós vimos à Mesa que foi aspergida para nós, porque Jesus já morreu. Nós, agora, colhemos os benefícios da sua morte. A morte de Jesus não pode ser re-dramatizada à Mesa. Nós podemos apenas desfrutar dos resultados da morte de Jesus - seu corpo e sangue dados a nós como alimento. Novamente, é uma mesa, e não um túmulo.
Em terceiro lugar, a outra interpretação de I Coríntios 11.26 é a que eu prefiro. A Ceia do Senhor é uma refeição memorial da aliança. Por meio da Ceia a igreja rememora a morte de Jesus, para o Pai. Compreendida no contexto dos "memoriais" do Antigo Testamento, esta refeição memorial da Nova Aliança é uma oração ritual dramatizada, relembrando a Deus de sua aliança. A Santa Ceia é o rito memorial da Nova Aliança. É o cumprimento de todos os antigos meios que o Senhor instituiu, pelos quais seu povo invocava o seu Nome e dramaticamente o pedia para que se lembrasse de sua aliança. Todos os memoriais da velha ordem estão agora cumpridos e completos (consolidados) em uma única e simples refeição memorial da aliança. Jesus diz: "Fazei isto em memória de mim".
À mesa, nós rememoramos a morte de Jesus. O sentido não é o de nós simplesmente a recordarmos, mas sim de nós relembrarmos a Deus das promessas de sua aliança para conosco. É da nossa ação com relação a Deus. É a nossa prece a Deus, o lembrar-se de Jesus e de manter sua aliança. Nós anunciamos ao Pai a morte do Senhor, pedindo-lhe para que mantenha as suas generosas promessas em Cristo. No caso da Santa Ceia, essa rememoração é um ato da congregação, uma declaração das promessas de Deus. Isso vem à tona nas orações de ação de graças (no grego: eucaristia) e de memorial antes da distribuição e comunhão do pão e do vinho, mas não se limita a elas. De fato, a refeição memorial inteira anuncia a morte de Cristo, como Paulo afirma em I Coríntios 11.26: todas as vezes que comemos do pão e bebemos do cálice, anunciamos a morte de Cristo.
Essa "proclamação" não se limita à oração ou ao partir do pão, mas ainda rememoramos Cristo ao Pai por meio da refeição comunitária. Eis o memorial do sacrifício redentivo de teu Filho, ó Senhor; lembra-te dele e sê generoso para conosco. Tradicionalmente, essas orações sempre incluíram um resumo da vida e da obra de Jesus Cristo. Uma oração eucarística deveria soar algo assim:
É verdadeiramente correto e apropriado que rendamos graças a ti sempre e em todo tempo, ó Senhor, nosso Pai Celeste, Deus Eterno e Todo-poderoso. Mas é especialmente próprio que nós, agora, reunidos diante desta Mesa, rendamos graças a ti pelas tuas generosas promessas em Cristo. Lembra-te, ó Pai, do nascimento humilde de Nosso Senhor, de sua vida santa, de seu sofrimento inocente; e de sua morte e de sua ressurreição e ascenção por nós. Sê fiel em cumprir tua aliança conosco por amor de Jesus, e vem agora alimentar-nos e capacitar-nos para servir o teu Reino. Pelo teu Espírito Santo, faze o corpo e o sangue de Nosso Senhor alimento vivificante para o teu povo; em nome de Jesus nós oramos. Amém.
Uma oração eucarística assim, unida à realização da Santa Ceia, anunciam a morte do Senhor (I Coríntios 11.26) para o Pai. A refeição toda é uma oração dramática, uma afirmação das promessas do Pai pela memória do nascimento, vida, paixão, morte e ressureição de seu Filho por nós.
Tudo isto para dizer que a nossa proclamação da morte do Senhor à Mesa não exige nem implica em uma atmosfera solene, funérea, da Santa Ceia. A morte de Jesus deve ser proclamada com alegria, seja para os outros (como anúncio do Evangelho), seja para o Pai (como memorial da obra de Jesus por nós).
segunda-feira, 11 de agosto de 2008
Presbiterianos & Liturgia, parte 10.
O efeito anti-litúrgico do imediacionismo e do individualismo na moderna soteriologia calvinista norte-americana (2)
Por Jeffrey Meyers
(Continuação da parte 9)
(Leia o original aqui)
Pelo menos um terço das Institutas de Calvino é dedicado à doutrina da igreja (Livro IV). A doutrina de Deus, do homem, de Cristo e da salvação, todas culminam no Corpo místico do qual Cristo é o Cabeça. Essa "alta" teologia eclesiástica pode ser encontrada em todos os reformadores do século XVI (confira AVIS, Paul D. L., The Church in the theology of the reformers. Atlanta: John Knox, 1981) e especialmente na teologia reformada do começo do século XVI (confira a ótima exposição em MACGREGGOR, Geddes. Corpus Christi: the nature of the Church according to the Reformed tradition. Philadelphia: Westminster Press, 1958). É nesta comunidade de carne e osso santos, diálogo oral, rituais materiais e sacramentos físicos que nós nos encontramos com Deus. Calvino avisa:
Se isso nos soa estranho ou simplesmente errado, é porque nós fomos infectados com uma mentalidade gnóstica. O Espírito fala através da Noiva (Ap. 22.17). Quando Jesus convoca as sete igrejas a ouvir o Espírito, ele quer que elas ouçam a voz de seu pastor/mensageiro enquanto ele lê a carta que é endereçada a cada uma (Ap., caps. 2 e 3). A primeira parte do Livro IV das Institutas trata "da necessariedade da igreja". Ao falar do material e bem visível corpo dos crentes na terra, Calvino diz:
É de se notar que Calvino não está falando de uma igreja invisível, "espiritual", mas da própria comunidade física dos crentes, que se reunem para servirem-se uns aos outros se serem os meios pelos quais Deus serve, pelo falar, o ouvir, o cantar e o orar por e em favor uns dos outros. De certa forma, a igreja é o mais preeminente dos meios de graça (confira LEITHART, Peter. Against "Christianity": for the Church; bem como o seu Sociology of infant baptism, dos quais ambos se encontram em Biblical Horizons: Christendom Essays, n. 100, dez. 1997, pp. 29-50 e 86-106).
Então por que tantos têm medo disso? Uma das idéias mais nocivas já lançadas no cristianismo reformado é essa noção de que Deus normalmente comunica a sua presença imediatamente [no sentido de "sem mediadores", N. do T.] à alma do homem, desviando-se de todos os meios externos, físicos. Sim, é verdade, e é parte do ideário da teologia reformada, que o Senhor é livre para operar fora dos meios constituídos, em casos extraordinários. Mas isso significa apenas que o Senhor ordinariamente trabalha da forma como prometeu, através dos instrumentos que ele mesmo apontou para comunicar sua graça, quais sejam, pela instrumentalidade das palavras audíveis de seus ministros, pela água do Batismo, e pelo pão e pelo vinho da Comunhão. Há, é claro, circunstâncias extraordinárias, nas quais não se limita àqueles meios o poder e a graça do Senhor. Mas por que é que nós deveríamos fazer uma "teologia das exceções"? Nós não podemos dizer que o Batismo tem qualquer efeito por causa do argumento do bandido da cruz? E do bebê que morre antes de chegar à pia? Fazer teologia apelando apenas para as exceções nos deixaria com uma compreensão muito empobrecida dos sacramentos.
Nós deveríamos, como pastores reformados, afirmar que os meios normais, ordinários, pelos quais Deus comunica as suas dádivas são, de fato, aqueles que ele mesmo constituiu, não outros além ou em torno deles, e muito menos sem eles! Esse é o modus operandi normal de Deus. O Espírito Santo normalmente opera através dos instrumentos físicos e humanos que ele mesmo ordenou. Do contrário, as promessas que são vinculadas a esses meios são enganosas e mesmo traiçoeiras.
Entender a promessa do Espírito Santo de usar os meios determinados pelo Senhor como instrumentos para entregar as dádivas do Reino é uma das marcas da eclesiologia sacramental reformada de Calvino. Por que não cremos no que Deus nos prometeu? Por que nos ofendemos em pensar que Deus realmente cumpre a sua promessa no Batismo? Ou na Ceia do Senhor? Ou no serviço da Palavra por meio dos que ele deu ao Ministério da Igreja? Um dos meus professores em Concordia diz: "Nós, pessoas modernas, não mais encontramos o Espírito Santo ele deveria ser buscado... não entendemos mais o elo prometido do Espírito Santo com os meios externos de graça, e talvez nem mais queiramos ouvi-lo. (NAGEL, Norman. Externum Verbum, Logia 6. Trinity 1997, pp. 27-32). Calvino diz assim, ao comentar João 20.23 e o comissionamento dos discípulos como ministros do Evangelho:
Por Jeffrey Meyers
(Continuação da parte 9)
(Leia o original aqui)
Pelo menos um terço das Institutas de Calvino é dedicado à doutrina da igreja (Livro IV). A doutrina de Deus, do homem, de Cristo e da salvação, todas culminam no Corpo místico do qual Cristo é o Cabeça. Essa "alta" teologia eclesiástica pode ser encontrada em todos os reformadores do século XVI (confira AVIS, Paul D. L., The Church in the theology of the reformers. Atlanta: John Knox, 1981) e especialmente na teologia reformada do começo do século XVI (confira a ótima exposição em MACGREGGOR, Geddes. Corpus Christi: the nature of the Church according to the Reformed tradition. Philadelphia: Westminster Press, 1958). É nesta comunidade de carne e osso santos, diálogo oral, rituais materiais e sacramentos físicos que nós nos encontramos com Deus. Calvino avisa:
Portanto, aquele que quer encontrar Cristo, deve primeiro encontrar a Igreja. Como alguém saberia onde estão Cristo e sua fé, se não souber onde estão seus seguidores? Aquele que quer saber alguma coisa de Cristo não deve confiar em si mesmo, ou construir seus próprios caminhos para o céu por sua própria razão, mas deve dirigir-se à Igreja, visitá-la e lá perguntá-lo (...) pois fora da Igreja não há verdade, não há Cristo, não há salvação.
Se isso nos soa estranho ou simplesmente errado, é porque nós fomos infectados com uma mentalidade gnóstica. O Espírito fala através da Noiva (Ap. 22.17). Quando Jesus convoca as sete igrejas a ouvir o Espírito, ele quer que elas ouçam a voz de seu pastor/mensageiro enquanto ele lê a carta que é endereçada a cada uma (Ap., caps. 2 e 3). A primeira parte do Livro IV das Institutas trata "da necessariedade da igreja". Ao falar do material e bem visível corpo dos crentes na terra, Calvino diz:
(...) porque é nossa intenção, agora, discutir a igreja visível, aprendamos do simples nome "mãe" o quão útil, e de fato necessário, é que nós devamos conhecê-la. Pois não há outro modo de se chegar à vida, senão se essa mãe nos conceber em seu útero, nos dar à luz, nos nutrir em seu seio, por fim, a menos que ela nos mantenha sob se cuidado e direção até que, deixando a carne mortal, nos tornemos como os anjos. Nossa fraquea não nos permite sermos dispensados de sua escola até que tenhamos sido alunos por toda a vida. Além disso, longe de seu seio ninguém pode ter esperança de qualquer perdão de pecados, ou de qualquer salvação (Institutas, IV.I.4).
É de se notar que Calvino não está falando de uma igreja invisível, "espiritual", mas da própria comunidade física dos crentes, que se reunem para servirem-se uns aos outros se serem os meios pelos quais Deus serve, pelo falar, o ouvir, o cantar e o orar por e em favor uns dos outros. De certa forma, a igreja é o mais preeminente dos meios de graça (confira LEITHART, Peter. Against "Christianity": for the Church; bem como o seu Sociology of infant baptism, dos quais ambos se encontram em Biblical Horizons: Christendom Essays, n. 100, dez. 1997, pp. 29-50 e 86-106).
Então por que tantos têm medo disso? Uma das idéias mais nocivas já lançadas no cristianismo reformado é essa noção de que Deus normalmente comunica a sua presença imediatamente [no sentido de "sem mediadores", N. do T.] à alma do homem, desviando-se de todos os meios externos, físicos. Sim, é verdade, e é parte do ideário da teologia reformada, que o Senhor é livre para operar fora dos meios constituídos, em casos extraordinários. Mas isso significa apenas que o Senhor ordinariamente trabalha da forma como prometeu, através dos instrumentos que ele mesmo apontou para comunicar sua graça, quais sejam, pela instrumentalidade das palavras audíveis de seus ministros, pela água do Batismo, e pelo pão e pelo vinho da Comunhão. Há, é claro, circunstâncias extraordinárias, nas quais não se limita àqueles meios o poder e a graça do Senhor. Mas por que é que nós deveríamos fazer uma "teologia das exceções"? Nós não podemos dizer que o Batismo tem qualquer efeito por causa do argumento do bandido da cruz? E do bebê que morre antes de chegar à pia? Fazer teologia apelando apenas para as exceções nos deixaria com uma compreensão muito empobrecida dos sacramentos.
Nós deveríamos, como pastores reformados, afirmar que os meios normais, ordinários, pelos quais Deus comunica as suas dádivas são, de fato, aqueles que ele mesmo constituiu, não outros além ou em torno deles, e muito menos sem eles! Esse é o modus operandi normal de Deus. O Espírito Santo normalmente opera através dos instrumentos físicos e humanos que ele mesmo ordenou. Do contrário, as promessas que são vinculadas a esses meios são enganosas e mesmo traiçoeiras.
Entender a promessa do Espírito Santo de usar os meios determinados pelo Senhor como instrumentos para entregar as dádivas do Reino é uma das marcas da eclesiologia sacramental reformada de Calvino. Por que não cremos no que Deus nos prometeu? Por que nos ofendemos em pensar que Deus realmente cumpre a sua promessa no Batismo? Ou na Ceia do Senhor? Ou no serviço da Palavra por meio dos que ele deu ao Ministério da Igreja? Um dos meus professores em Concordia diz: "Nós, pessoas modernas, não mais encontramos o Espírito Santo ele deveria ser buscado... não entendemos mais o elo prometido do Espírito Santo com os meios externos de graça, e talvez nem mais queiramos ouvi-lo. (NAGEL, Norman. Externum Verbum, Logia 6. Trinity 1997, pp. 27-32). Calvino diz assim, ao comentar João 20.23 e o comissionamento dos discípulos como ministros do Evangelho:
Agora vemos o motivo pelo qual Cristo emprega termos tão grandiosos, para elevar e adornar o ministério que ele confia e entrega aos Apóstolos. É para que os crentes possam ser plenamente convencidos de que o que eles ouvem a respeito do perdão dos pecados está ratificado e não pode ter menos valor a reconciliação que é oferecida pela voz dos homens, do que se o próprio Deus estendesse sua mão dos céus. E a igreja recebe diariamente o mais abundante benefício dessa doutrina, quando percebe que seus pastores são divinamente ordenados para que sejam certeza da eterna salvação, e que não se precisa ir longe para buscar o perdão dos pecados, que é confiado aos seus cuidados. (Commentary on the Gospel according to John, v. 2, trad. William Pringle. Grand Rapids: Baker, 1981, p. 272)
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